Aliança
Coloquei a nossa aliança no dedo anelar da mão direita. Ficou apertada, mas eu não disse nada. Sim, sim, eu mesmo a coloquei: você nem sequer estava aqui. Disse que teria uma reunião de negócios com sua secretária, Kátia, em plena noite de ano-novo. Enviou as alianças para mim via Sedex, e eu te perdoei. Afinal de contas, isso era uma prova de amor. Se você não me amasse, teria escolhido um PAC, e as alianças chegariam apenas no próximo dia útil. 21 dias depois, quando você retornou da sua reunião, alegando ter precisado levar sua secretária para assinar uns documentos em Paris, quis te contar a verdade, mas hesitei. Ah, a aliança estava apertada, mas também ele dizia estar, e temi que, caso eu compartilhasse meu incômodo, ele tivesse que fazer outro empréstimo para negativados em meu nome na Crefisa, só para mandar afrouxar a aliança. Não queria lhe dar mais esse trabalho: após quase um mês na França com sua secretária, assinando documentos e visitando pontos turísticos badaladíssimos, ele devia estar cansado. Doía, mas procurei seguir e conviver com aquela pressão no dedo que já havia se tornado parte de quem eu era. Fiz de tudo para tentar, ao menos, aliviar essa dor. Busquei emagrecer: fiz jejum de 72 horas, tomei todos os shakes da Herbalife vencidos em 2006 que encontrei no fundo do armário da cozinha de mamãe, passei a fumar cigarros paraguaios contrabandeados e me submeti a 3 cirurgias; sendo uma para a retirada da vesícula, outra para a retirada de um dos rins e a última para a retirada das costelas. Cogitei também amputar alguns membros, mas sabia que o lado conservador, preconceituoso e capacitista dele não me aceitaria assim. Por isso, tudo o que tirei foi de dentro. Os dias passavam, e o aperto em meu coração só não era maior do que o aperto no dedo anelar da mão direita. Após hospitalização devido a um árduo jejum de 25 dias, eu estava com apenas 3,76 quilos e, ainda assim, a aliança continuava apertada. Meu dedo estava superinchado. O roxo que se assemelhava ao sangue em minhas fezes tornava-se paulatinamente preto e, se eu batesse o dedo em algum lugar por descuido, ele cairia, subitamente. Como podia isso, meu Deus? Ah, como chorei! Foram noites em claro pensando em como te dizer o que ficava cada vez mais difícil esconder: sim, a aliança ficou apertada. Enquanto eu me aproximava, você, sem olhar uma só vez para mim e sem parar de mexer no celular, franziu a testa e murmurou, baixinho: "Será que a Kátia deixou aqueles contratos confidenciais no motel ontem à noite?" Ah, como me senti culpado. Lá estava ele, pensando em trabalho de novo, na hora de dormir, e eu iria incomodá-lo com um problema tão fútil... Mesmo assim, não via outra saída: era chegada a hora de colocar a situação em pratos limpos.

6 Comentários:
Gabrielhando
COMENTE SE VOCÊ GOSTARIA DA CONTINUAÇÃO
Eu estava com apenas 3,76 quilos
EU QUERO CONTINUAÇÃO
Eu quero continuação!!!
Eu quero continuação IMEDIATAMENTE
Postar um comentário
Assinar Postar comentários [Atom]
<< Página inicial